Wellington Luiz: “Moradia a quem precisa”

A política habitacional do Distrito Federal virou assunto de polícia. À frente da Companhia Habitacional do DF (Codhab) há pouco mais de seis meses, o policial civil aposentado e ex-deputado distrital, Wellington Luiz, vem implementando medidas para moralizar o programa habitacional do DF e garantir moradia para quem de fato precisa. Hoje, mais de 110 mil famílias estão à espera da casa própria no DF. A maioria delas espera há mais de 20 anos.

“Nossa lista não anda”, reconhece. Em entrevista à Agência Brasília, Wellington diz que encontrou uma política travada e criou uma fiscalização para impedir a venda dos imóveis financiados pelo programa habitacional. “Não faz sentido a pessoa comprar, com subsídio, o seu imóvel no Mangueiral, por exemplo, e vender um ano depois, ou emprestar ou alugar”, afirma. “É preciso alguém para explicar como é que uma pessoa está esperando há 30 anos e nunca foi chamada. É exatamente isso que a gente veio corrigir, dando direito a quem tem direito”, completa.

Segundo o presidente da Codhab, a atual gestão identificou quase 600 imóveis para serem retomados pelo governo porque os beneficiados não respeitaram as regras do programa e venderam ou alugaram a casa ou apartamento. E aí entra outra distorção que ele pretende combater. Quando o imóvel é retomado pelo Estado, ele não volta para a Codhab para ser ofertado a quem está na lista. Ele vai para o agente financeiro que vai leiloá-lo. “Só que a área é nossa. Esse imóvel deveria voltar para atender a lista”, reclama. “Já comunicamos o problema para o governador e estamos estudando um projeto de lei para mudar isso”, diz.

Confira a entrevista.

Quantas famílias estão na lista da Codhab atualmente e quantas estão habilitadas para participar do programa habitacional do governo?

Inscritas hoje nós temos aproximadamente 110 mil famílias. E habilitadas, vai variar, dependendo do projeto que está encaminhado. Se temos duas mil unidades habitacionais para entregar a gente habilita um número específico de famílias. A habilitação se dá para que a família possa ter condições de receber o imóvel por isso vamos habilitando por projeto habitacional entregue. Agora nossa lista não anda. Essa é uma briga minha com a diretoria. Alguém tem que me explicar. Tiro por mim. Sou filho de Brasília e, aos 18 anos, fiz a inscrição. Eu nunca fui chamado. Hoje não tenho direito, mas eu tinha que ter sido chamado pelo menos para ser reprovado. Tem alguma coisa errada nessa história. Aí tem uma prima minha que veio da Bahia, com menos de dois anos recebeu um lote e vendeu com menos de um ano. E acabou voltando para a Bahia. Alguém tem que explicar essa política.

O governador Ibaneis Rocha deu alguma orientação para a atuação da Codhab?

Não gosto de ficar olhando para trás não, mas recebemos uma política travada, onde houve um retrocesso completo ao longo de muitos anos. Nós tivemos primeiro que colocá-la nos trilhos. Não paramos os projetos em andamento por uma questão de responsabilidade. Decidimos dar continuidade aos projetos que já existem, melhorando muitos deles, e acelerar a oferta de novas unidades. É prioridade do governador dar moradia a quem precisa. Não adianta estar na fila e esperar 20 anos.

DECIDIMOS DAR CONTINUIDADE AOS PROJETOS QUE JÁ EXISTEM, MELHORANDO MUITOS DELES, E ACELERAR A OFERTA DE NOVAS UNIDADES

Essa é a média de tempo que as pessoas esperam?

Algumas estão inscritas há 30 anos, 35 anos e até mais. É preciso alguém para explicar como é que uma pessoa está esperando há 30 anos e nunca foi chamada. Não tem sentido. Alguma coisa errada aconteceu. Ou quase tudo. É exatamente isso que a gente veio corrigir, dando direito a quem tem direito. Essa é uma das nossas principais missões.

Corrigir o que por exemplo?

Não faz sentido a pessoa comprar o seu imóvel com subsídio no Mangueiral, por exemplo, e vender um ano depois, ou emprestar ou alugar.

Qual a regra atual? Porque hoje o governo não dá mais lotes, certo? Com valores subsidiados, mas os imóveis são vendidos…

A gente doa também no caso dos vulneráveis, famílias que não têm renda nenhuma. Até um salário mínimo o estado ainda provém. Ainda existem esses casos, que não são poucos.

Mas a política habitacional não é mais como foi no passado, unicamente de doação de lotes…

Hoje está mais disciplinado. A gente não entrega se não for em área com infraestrutura, geralmente o imóvel está pronto… Apesar de estarmos pensando em um novo modelo, porque antes tinha o Minha Casa Minha Vida que trazia recursos e hoje não tem mais. Estamos nos reinventando para poder atender de fato a essas famílias. Talvez até voltemos com os lotes em alguns casos específicos. Existem projetos para isso.

ESTAMOS NOS REINVENTANDO PARA PODER ATENDER DE FATO A ESSAS FAMÍLIAS

E como impedir que o beneficiado pelo programa habitacional, que comprou o imóvel, revenda ou alugue?

A pessoa não compra pelo valor de mercado, o preço é subsidiado. Você pega um lote no Guará que vale 200, 300 mil, por exemplo. Ele é vendido a 70 mil pela Codhab. De fato, ele não é dado, mas custa um terço do valor. Para receber é preciso cumprir a regra: não pode vender antes de dez anos de ser contemplado. Esse prazo até pode ser flexibilizado, mas não pode a família alugar ou vender depois de seis meses. Se ela está fazendo isso, não precisa.

E isso acontece muito, não é?

Muito, mas antes não havia uma política de fiscalização. O governo passado todo retomou pouco mais de 60 imóveis. Em seis meses de governo, já identificamos quase 600 para serem retomados, no Paranoá Parque e no Mangueiral, por exemplo. Mas aí vem outra anomalia. Quando você retoma, em vez do imóvel voltar para a Codhab e ir para a lista, ele vai para o agente financeiro que vai leiloá-lo a preço de mercado. Só que a terra é do estado. Isso a gente precisa corrigir. Se o contemplado não respeitou as regras e o Estado toma o imóvel, algo até tem que ser devolvido para a Caixa Econômica, mas a área é nossa. Esse imóvel deveria voltar para atender a lista, até porque a Caixa nunca vai ser prejudicada, o próximo contemplado vai pagar do mesmo jeito. Ou, pelo menos, a instituição financeira deve ria reembolsar o GDF sobre o valor da terra.

E a Codhab pretende fazer algo em relação a essa situação?

Já comunicamos o problema para o governador. Estamos estudando um projeto de lei e vamos apresentar uma proposta nesse sentido, que corrija essa distorção que consideramos muito grave. Hoje a retomada do imóvel tem apenas o caráter educativo. É apenas um ato intimidatório, mas, no futuro, vamos fazer com que ele volte para nossa lista que é ideal ou, no mínimo, que o DF seja ressarcido desses valores de alguma forma.

As primeiras unidades desta gestão serão lançadas agora no segundo semestre, certo?

Até dezembro, vamos entregar 2.360 unidades habitacionais. O primeiro projeto será a quadra 700 do Sol Nascente, com previsão de entrega de 132 unidades em agosto e mais 176 em dezembro. Depois tem o Setor Crixá, em São Sebastião, com 1.904 unidades habitacionais; e dois residenciais em Samambaia. Isso é a previsão que a gente já tem, mas vamos lançar novos editais. Todo o governo está trabalhando para isso. Temos conseguido fazer uma articulação e, com isso, acelerando os projetos. Se antes demorava três anos, hoje demora três meses. A gente tem um projeto agora para lançar o Vale da Bênção que estava parado, no Recanto das Emas. Estamos falando inicialmente de 12 mil, chegando a 24 mil unidades habitacionais. É uma cidade que vai suprir boa parte das necessidades da população mais carente do DF. Se somar o Vale da Bênção com o Itapoã Parque, são 35 mil unidades.

Como está o processo do Itapoã Parque?

As obras estão avançadas, as famílias estão sendo chamadas para serem habilitadas, são 12 mil unidades habitacionais. São 30 meses de obra que devem ficar prontas daqui a dois anos. O governador cobrou a antecipação e estamos tentando acelerar o processo para atender a população.

Haverá mudanças nas regras do programa habitacional do GDF?

O programa continua com o nome de Habita Brasília e as regras são as mesmas. Famílias com renda de até cinco salários mínimos são atendidas e precisam morar em Brasília há pelo menos cinco anos. Nós tivemos um cuidado que a gestão passada não teve. Não paramos os projetos para não prejudicar as famílias. O governo Rollemberg parou tudo que tinha sido feito nos governos anteriores e passou dois, três anos arrumando a casa. Pararam de arrumar a casa em ano de eleição e não deu tempo de fazer nada. Não vamos ser irresponsáveis de negligenciar uma política tão importante. Temos que dar continuidade ao que eles fizeram para não prejudicar a população. Estamos aqui há seis meses, mas tem gente esperando há 20 anos.

AS PESSOAS FORAM PARA AS ÁREAS IRREGULARES PORQUE NÃO TINHAM ALTERNATIVA

Combater as invasões também faz parte da política habitacional…

A lista só anda na medida em que o governo tenha terras para construir imóveis para as pessoas que estão regularmente inscritas. É preciso ações de governo para desestimular as invasões. Quando há invasão nas terras destinadas para essa população acaba prejudicando a política habitacional. As pessoas não podem simplesmente entrar e dizer esse pedaço da terra é meu. Muitas pessoas, às vezes por necessidade ou estimuladas por grileiros, estão achando que vão entrar e não terá consequências. Primeiro elas serão retiradas, depois, se estiverem inscritas, serão excluídas da lista e não terão mais direito. O estado sempre concorreu com o grileiro, que sempre foi mais eficiente. Nunca teve uma política habitacional que fizesse com que as pessoas acreditassem nela. A política habitacional tem que funcionar para os mais pobres, mas também para a classe média que é esquecida. As pessoas foram para as áreas irregulares porque não tinham alternativa. Nós seremos extremamente rigorosos com novas invasões. À medida que eu combato a grilagem, eu imediatamente dou condições para a lista fluir.

GIZELLA RODRIGUES, DA AGÊNCIA BRASÍLIA

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